A pandemia não se encerrará por decreto. Será preciso acreditar
Nas últimas semanas, como consultora em comunicação e comportamento empresarial, tenho ouvido muitas teses sobre o tal do “novo normal” no mundo corporativo. Como mãe, os debates são sobre a volta às aulas. Como mulher, amiga, filha e irmã, a conversa vai de lembranças saudosistas de um simples almoço de domingo com todos de volta à mesa, o violão, as crianças, as aulas de ginástica na academia, as festas de aniversário, as viagens, os encontros das confrarias…
Noite dessas, repassando algumas frases dessas discussões na minha cabeça, veio a sensação de que era como se as conversas falassem de um mundo em que as pessoas almejam viver, como se nele não estivéssemos.
É como se alguém tivesse apertado o pause no controle remoto, e estivéssemos, todos, esperando o momento de retomar o filme. Enquanto isso, comentamos sobre o que passou até aqui.
O botão do pause
Ao comparar esses meus vestígios de conversas com o noticiário diário, esse sentimento se materializa ainda mais. Parece que estamos em um daqueles filmes em que criaturas invadiram a terra, e os sobreviventes foram obrigados a se esconder nos porões, esperando o momento de poder voltar a circular. Enquanto isso, os monstros estão se combatendo pelas ruas destruídas, com pilhas de mortos.
A analogia é de cidadãos reféns de decisões oficiais envoltas em disputas e polarizações políticas que embaçam o ambiente. O desencontro de mensagens das autoridades públicas e sanitárias, potencializados por um bombardeio de mensagens (falsas e verdadeiras), que nem sempre temos condições de filtrar, fez os brasileiros acionarem o botão do pause (aqui pause = “instinto de sobrevivência”), segmentando-nos entre os que temem, os destemidos e os teimosos.
“É a economia, estúpido”
E, aí, acredito, um ponto merece um pouco mais de reflexão.
Para explicar, vou me apoiar na máxima cunhada por James Carville, o marketeiro de Bill Clinton, que apostou que George Bush não era invencível nas eleições de 1992. Apesar de Bush estar em alta e ter vencido a guerra do Golfo, a economia em frangalhos era o seu ponto fraco. Daí, a célebre frase: “É a economia, estúpido”.
Adaptando Carville, arrisco dizer: “É a confiança, estúpido”. Ao contrário de outros lugares no mundo em que as restrições de circulação foram mais duramente impostas – o que transferiu ao poder público um certo poder de encerrar a pandemia –, aqui no Brasil essa autoridade ficou esvaziada.
Governadores pede isolamento, e as ruas estão cheias. Governadores decretam o fim do isolamento e brotam cartas e análises de especialistas em saúde, alertando para os riscos do momento, da volta às aulas e por aí vai.
Presidente e ministros minimizam a pandemia nos discursos, e empresas anunciam que manterão o trabalho à distância até o final do ano.
Tudo uma reação política? Claro que não. “É a confiança, estúpido”.
Sem desconsiderar o contexto político, mas, como tudo o que assistimos aterrorizados na TV das nossas casas nesses meses de pandemia, precisamos de confiança para acreditar que algo está normal. É o velho ditado: ver para crer.